Meia hora de espera depois lá vem
ele. Estico o meu braço, eu e mais uma dúzia e meia de pessoas. Torço para ele
parar na minha frente, mas por azar ele passa 1 metro de onde estava,
mais do que o suficiente para me obrigar a entrar numa fila disforme para
embarcar. Em passos lentos até a porta, no meio do empurra-empurra dou uma espichada
para o lado de dentro, calculo aproximadamente quantas cadeiras vagas tem no
seu interior para saber se sobrará uma para mim quando subir. Enfim a minha
vez, passo o cartão na máquina e giro a roleta, observo o corredor e vejo dois
assentos desocupado na ultima fileira, fui até lá e sentei. Finalmente sentado,
finalmente relaxado. Agora é só curtir a viagem, talvez tirar um cochilo e
esperar chegar na minha parada. Entretanto quando estava ali sentado pensando
na vida, com fone de ouvido curtindo Audioslave, entra uma das mulheres mais
bonitas que tinha visto na minha vida. O sono passou, o cansaço passou, a
música acabou, toda a cena ficou cinza tirando a mulher que era a único ser colorido
e iluminado a minha frente. Fiquei a observar seus movimentos que pareciam
estar em câmera lenta, todo o gesto era fascinante, o sorriso, a piscada de
olho, a mão entregando o dinheiro, o quadril ajudando a girar a catraca, o
caminhar... ah o caminhar, mesmo estando num ônibus lotado, ela, naquele
corredor apertado, parecia que estava desfilando numa passarela com o vestido a
esvoaçar com os imaginários ventiladores estrategicamente posicionados e a luz
a te acompanhar. Depois de tamanha admiração pensei: “bem que esse gordo
poderia se levantar para ela sentar ao meu lado. Se isso me acontecesse não
perderia essa chance.”. E como se o homem que estava ao meu lado tivesse
escutado meus pensamentos, ele se levantou, pediu parada e se encaminhou para a
porta de saída. E como um desejo realizado por um gênio da lâmpada mágica, ela
sentou ao meu lado. Entrei em pânico! Ou talvez choque. Quem sabe os dois. Não
consegui acreditar na coincidência. Mas e agora? Como poderia abordar uma
pessoa totalmente estranha dentro de um ônibus? Que conversa poderia puxar que
não parecesse estranha? Desisti, não tinha como ter alguma chance com uma
mulher como aquela, mas pensei: “mas seria demais se ela falasse comigo.”
- Sabe me dizer se esse ônibus é
Maria Lacerda ou Abel Cabral?
Não, isso não pode estar
acontecendo. É coincidência demais. Tive meu segundo desejo realizado.
Realmente tem algum gênio a meu favor, talvez não fosse da lâmpada, mas devo
ter esfregado alguma garrafa para merecer isso. Abri a minha boca para
responder e tentar puxar uma conversa, mas só saiu:
- Maria.
- Ai que bom. Obrigada!
Um sorriso foi o máximo que
consegui esboçar como resposta. Não podia acreditar que o destino estava me
dando todas as oportunidades e eu não as estava aproveitando, como eu detesto
essa timidez que me ocorre nos momentos menos propícios. Para tantas coisas eu
tenho uma cara de pau sem tamanho e para outras sou simplesmente um banana.
Enfim, fiquei lá me rebaixando a mais baixa das criaturas covardes, até que me
veio uma idéia. Apesar de ser um absurdo, não custava nada tentar, afinal nas
ultimas duas vezes funcionou. Vamos lá, é o meu terceiro e último desejo.
Concentrei todas as minhas forças nesse pensamente e fiz o desejo: “bem que ela
poderia me beijar sem razão aparente, simplesmente porque deu vontade”. Ela se
moveu. Será que iria realmente acontecer? Será que realmente tinha ganhado um
gênio que estava realizando os meus desejos? Por alguns segundos eu realmente
estava acreditando nessa possibilidade absurda, mas no segundo seguinte cai na
real. Ela apenas se levantou, pediu parada e desceu do ônibus. É... realmente
não podemos deixar tudo na mão do destino, uma hora ele se cansa.
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